terça-feira, 3 de julho de 2012
Alma em Suplício (1945)
Tiros estouram na noite e um homem moribundo arqueja: Mildred! Em um flashback clássico que remonta à gênese da obsessão e do assassinato, a assassina confessa Mildred Pierce (Joan Crawford no papel ganhador do Oscar que ressuscitou a carreira estagnada da atriz de 41 anos) explica em um interrogatório policial como batalhou como dona de casa, garçonete e confeiteira até se tornar uma próspera dona de restaurante para satisfazer as exigências de sua filha Veda (Ann Blyth) por coisas luxuosas. Quando as duas são fatidicamente seduzidas por um cafajeste de fala mansa e dissimulado (Zachary Scott), a transigência sufocante e neurótica da possessiva Mildred e os desejos precoces da ingrata Veda resultam inevitavelmente em traição sexual e ódio.
Um típico filme para mulheres da década de 40 e uma novela doméstica fervilhante, o filme de Michael Curtiz, adaptado por Ranald MacDougall de um romance surpreendentemente perverso de James M. Cain (famoso por "Pacto de Sangue" e "O Destino Bate a Sua Porta), é também um filme noir esplendidamente cruel, que devasta o ideal da época de devoção materna e tortas de maçã da mamãe. Mildred é inteligente, ambiciosa e obstinada, qualidades respeitadas e recompensadas pela ética americana. Porém, aos poucos, ela se distancia do seu honesto, porém fracassado, marido (Bruce Bennett) e, à medida que favorece a insolente Veda em detrimento da sua mais doce filha caçula, deixando a morte da criança para trás aparentemente sem pensar duas vezes, começamos a notar um aspecto pouco saudável - e talvez até patológico - da compulsão.
Nunca o melodrama foi tão convincente. Mesmo para aqueles que são geralmente desestimulados por Crawford, com seus traços duros e ombros quadrados, sua atuação intensa e incontida como Mildred é tragicamente doentia e cativante. Blyth, de apenas 17 anos, está sarcasticamente sensacional como a femme fatale desdenhosa. Curtiz é um diretor que impôs sua personalidade em filmes de todos os gêneros. A forma magistral como ele dispõe do seu elenco (que conta com coadjuvantes excelentes como Eve Arden, Jack Carson e Lee Patrick) e os diversos elementos técnicos - as alternâncias expressivas dos subúrbios ensolarados para pesadelos sombrios de Ernest Haller, o fotógrafo ganhador do Oscar por "E o Vento Levou...", e a trilha sonora dramática de Max Steiner - são inebriantes.
Vencedor do Oscar de Melhor Atriz (Joan Crawford). Indicado aos Oscar de Melhor Filme, Atrizes Coadjuvante (Eve Arden e Ann Blyth), Fotografia e Roteiro.
(Mildred Pierce - 1945)
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