quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012
Setembro (1987)
Uma casa isolada em um local pacífico, uma mãe que consumiu a felicidade da filha em benefício próprio e o conseguinte trauma são laivos de “Sonata de Outono” em “Setembro” (1987), filme emocionalmente trágico de Woody Allen.
Lane (Mia Farrow) é uma mulher retraída, o sofrimento está estampado em seu rosto por causa dos abalos psicológicos provocados por uma incrível tragédia. Nova York, a queridinha do diretor, é a salvação de sua protagonista. Na cidade inspiradora, Lane pretende recomeçar a vida ao lado de Peter (Sam Waterston), um charmoso escritor em crise.
Sua adolescência, fase da vida naturalmente conturbada, foi maculada com o sangue do amante de sua desatinada mãe Diane (Elaine Stritch). A solução do mistério que envolve o assassinato é deixada para depois, no ápice de uma altercação. Stephanie (Dianne Wiest), amiga de Lane, sofre comedidamente por um casamento sem romantismo. Quando resolveu buscar a paz na casa da amiga em Vermont, Stephanie não imaginou que um homem incitaria impiedosamente sua turbulência interior. Howard (Denholm Elliott) é um professor de francês apaixonado. Ao conviver prazenteiramente com Lane, pôde perceber o aparecimento de um sentimento surpreendente, sua viuvez não foi proibitiva. Lane, por sua vez, somente reconhece a gentileza em Howard. Ela está perdidamente apaixonada por Peter, cujos olhos só enxergam com paixão uma única pessoa — Stephanie. O físico Lloyd (Jack Warden) também se encontra, acompanhando a namorada Diane.
Uma tempestade furiosa anuncia a escuridão. A luz da residência desaparece e a eletricidade dos relâmpagos ilumina precariamente os personagens. No próximo plano, uma vela esforça-se para iluminar uma pequena parte da casa com sua chama bruxuleante. Na penumbra, todos emitem uma espécie de luz própria. Howard expõe seu amor, e Lane, com cuidado para não lhe machucar, cita a paixão que mantém por Peter. Lloyd, apoiado em seus conhecimentos, fala sobre a triste realidade do universo. Aleatório e perfunctório. Diane, levemente afetada pela bebida, adentra na imensidão do passado. Para Stephanie a fuga é a única opção sensata, seu desejo por Peter é diminuto diante da enorme dimensão dos problemas. Peter e Lane dialogam, ela inocentemente crê que a incapacidade dele em concretizar um relacionamento amoroso é consequência do período delicado em que vive. A conversa termina com sorrisos sinceros. Com Stephanie ao piano, a luz retorna sem aviso.
A maturidade está presente inclusive na filmagem, Allen revelou que nunca filmaria da mesma maneira em suas primeiras películas. O que vemos na tela é uma reinvenção. Não satisfeito com a primeira versão, o diretor optou por uma nova filmagem. É possível sentir o desenvolvimento da complexidade na aparente simplicidade de “Setembro”. A psique humana é composta por caminhos sinuosos, apenas habilidade é insuficiente para explorá-la com segurança. Aqui, a diversidade do amor ― o amor próprio, o irrefreável e o extremamente puro e simultaneamente não correspondido ― merece uma análise minuciosa. O título do filme deixa bem evidente a importância do futuro. Stephanie comenta que o mês de Setembro está próximo e diz que tudo vai dar certo. O espetáculo é encerrado após uma concreta sensação de ambiguidade. Afinal, o universo é aleatório.
“Penso que o filme Setembro é o melhor filmado por mim até então. Foi feito com mais sofisticação porque estávamos todos naquela casa e a câmera estava constantemente em movimento e havia montes de coisas a acontecer além da câmera. Nos meus primeiros filmes nunca filmaria desta maneira.” – Woody Allen em 1987
(September - 1987)
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