segunda-feira, 27 de junho de 2011

Desencanto (1945)


Os épicos imponentes da maturidade de David Lean às vezes ameaçam ofuscar os relativamente modestos primeiros trabalhos do diretor. Porém, concentrar-se demais no puro espetáculo de “Lawrence da Arábia” e “Doutor Jivago” significa ignorar algumas das maiores façanhas de Lean. Afinal, apenas um cineasta de primeira grandeza poderia dirigir “Lawrence da Arábia”, e este mesmo domínio da forma está patente nos seus filmes anteriores, embora em escala muito menor.

Lean já havia dirigido três adaptações da obra de Noel Coward quando iniciou “Desencanto”, baseado na peça de um ato do autor chama Still Life. Contudo, a brevidade da peça o forçou a expandir o material e, durante o processo, ele ampliou também seu próprio vocabulário cinematográfico. Contado em flashback, “Desencanto” acompanha o caso amoroso platônico entre a dona-de-casa Laura (Célia Johnson) e o médico Alec (Trevor Howard), que se conhecem por acaso em uma estação de trem. Há obviamente uma conexão entre os dois, porém ambos sabem que o romance não pode ir além de alguns almoços furtivos.

Ao elaborar um dos mais eficazes arranca-lágrimas da história do cinema, Lean realizou uma série de avanços formais que lhe deram rapidamente a reputação de mais do que um mero seguidor de Noel Coward. Para começar, ele retirou a história da estação de trem, acrescentando mais detalhes ao romance malfadado. Explorou também todo aparato cinematográfico à sua disposição; a iluminação, por exemplo, se aproxima do visual grave de suas adaptações posteriores de Dickens, tornando o mais simbólica possível a estação escura e esfumaçada. Os efeitos sonoros também são bem utilizados (especialmente o de um trem acelerando), assim como a música, que incorpora o “Concerto para piano nº 2” de Rachmaninoff como tema do filme.

No entanto, o mais importante é a utilização por parte de Lean de closes frequentes nos olhos de Johnson, que contam melhor uma história do que muitos roteiros. Ela e Howard estão excepcionais nesta que é a mais triste das histórias, cada movimento dos dois prenhe de significado e os diálogos impecáveis repletos de emoções profundas. Um olhar furtivo, um dedo acariciando a mão do outro e um riso compartilhado são praticamente tudo que é permitido a esses amantes desventurados, e Johnson e Howard transmitem belamente essa triste certeza.

Nomeado ao Oscar de Melhor Atriz (Celia Johnson), Diretor (David Lean) e Roteiro.

(Brief Encounter - 1945)

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