sexta-feira, 22 de abril de 2011

Agora Seremos Felizes (1944)


Uma garotinha chamada Tootie (Margareth O'Brien), chorando e furiosa, sai de dentro de casa e corre para a neve. Uma vez lá, começa a destruir seus adorados homens de neve - um símbolo de tudo o que é estável e reconfortante na sua existência familiar - com uma energia e virulência extremamente pertubadoras. Quem imaginaria que Judy Garland cantando "Have Yourself a Merry Little Christmas" teria um efeito tão devastador na frágil psique de uma criança, ou na nossa?

"Agora Seremos Felizes", de Vincent Minnelli, é um dos musicais mais incomuns e emotivos da história de Hollywood. Ele mistura os dois gêneros dos quais Minnelli era mais adepto - o musical e o melodrama -, chegando até, em seus momentos mais sombrios (como a sequência dedicada aos horrores do Halloween), a quase se tornar um filme de terror. Ele é também um filme que, tanto na época quanto agora, se permite ser interpretado de formas totalmente contrastantes: ou como uma celebração perfeitamente inocente e ingênua dos valores familiares, ou como uma reflexão sobre tudo que destrói a unidade familiar por dentro. Em outras palavras: seria ele um entretenimento reconfortante e escapista que admite ser problemático para poder desobstruir e reforçar o status quo ou - quase à sua própria revelia - um gesto subversivo no coração do sistema hollywoodiano, um grito de raiva incontida como o massacre de Tootie da sua tribo imaginária de homens de neve?

Sim, estou falando sobre o mesmo filme em que Garland observa apaixonada seu vizinho e canta "The Boy Next Door" e - em um ponto alto espetacular - rodopia com um monte de passageiros coloridos enquanto canta "The Trolley Song" ("Zing, zing, zing went my heartstrings..."). O projeto de Minnelli é discretamente ambicioso: ele não pretendia apenas contar a história de uma adorável família "comum" - e dos desafios que ela enfrenta com estoicismo -, mas também esboçar a história de uma audaciosa sociedade do século XX, definida por acontecimentos como a Feira Mundial.

A sensibilidade artística de Minnelli - a sexualidade dele pode ser tanto uma questão em aberto quanto um segredo escancarado, dependendo de qual história de Hollywood você consulta - estava em sintonia com os anseios femininos e com a ansiedade masculina, e um excesso de ambos torna este musical inexoravelmente dramático. O patriarcado surge na forma estúpida e rabugenta de Leon Ames, que tenta afirmar bravamente sua autoridade em face de uma família esmagadoramente feminina. A série de namorados das garotas também precisa ser instigada, manipulada e informada de seu verdadeiro destino conjugal.

Quanto aos desafios estéticos de um musical, Minnelli e seus colaboradores conseguiram praticamente integrar canções e dança a um fluxo de incidentes extravagantes, dignos de um conto de fadas. Canções começam como frases jogadas, faladas ou cantaroladas na rua ou diante de uma porta e somem de repente quando uma intriga surge na trama.

Sob a elegante demonstração de estilo cinematográfico e o verniz civilizado das boas maneiras, apenas Tootie é capaz de expressar emoções selvagens e indomadas - como "Under the Bamboo Tree", seu exótico dueto com Judy, indica com jovialidade.


Indicado ao Oscar de Fotografia, Música, Trilha Sonora e Roteiro.

(Meet Me in St. Louis - 1944)

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