quinta-feira, 22 de maio de 2014

Em Paris (2006)


Numa das primeiras cenas, o personagem de Louis Garrel olha para a câmera e diz: “É realmente possível que uma história de amor nos faça querer pular de uma ponte?”. Ele diz isso com tanta convicção, e olhando tão diretamente nos olhos do público, que a pergunta realmente se torna uma provocação.

Logo depois, ele muda esse tom trágico e a comédia dramática "Em Paris" entra nos trilhos de um romantismo desesperado que acompanha os personagens ao longo de um dia em sua vidas. O diretor e roteirista Christophe Honoré demonstra um carinho enorme por seus protagonistas: os irmãos Jonathan (Garrel) e Paul (Romain Duris). Mas o carinho maior do cineasta é pelo cinema francês. O longa desenvolve-se como uma colagem de melhores momentos dos mais variados estilos e escolas – em especial a Nouvelle Vague.

Do cineasta Jean-Luc Godard, Honoré pega emprestado cortes e monólogos nos quais os personagens falam olhando diretamente para a câmera. Inspira-se em François Truffaut para compor o clima de seu romantismo e a visão dos relacionamentos amorosos – em especial, a partir de filmes como "Domicílio Conjugal" e "Beijos Roubados". Do cinema de Jacques Démy, vem o tom musical – numa das cenas mais tocantes do filme, um dueto via telefone. Os diálogos, nos quais se tenta resolver tudo, remetem ao melhor do cinema de Jacques Rivette e Éric Rohmer.

Mas Honoré não é apenas um aprendiz. Ele reverencia seus mestres, mas encontra seu próprio estilo ao contar as desventuras amorosas dos irmãos. Os dois são apresentados em forma de contrastes: luz e sombra, alegria e tristeza, esperança e desespero. Jonathan simboliza todos os pontos positivos. Já Paul acaba de sofrer uma decepção amorosa, mal consegue sair da cama, tamanha sua depressão.

Os dois moram no apartamento do pai (Guy Marchand), que se esforça, quase sempre em vão, para melhorar o humor dos filhos. Como está próximo do Natal, a mãe (Marie-France Pisier) faz uma visita rápida. Porém, as figuras femininas pouco têm a fazer ou dizer por aqui, embora sejam sempre a motivação do comportamento dos homens.

Para Paul, que acabou de se separar de Anna (Joana Preiss), a vida não tem mais sentido. Ele mal se alimenta ou toma banho. Cabe a Jonathan contar a história do irmão – mas ele mesmo tem seus próprios amores para viver. Nessas suas aventuras, ele evoca momentos clássicos da Nouvelle Vague, como as gargalhadas românticas de "Jules e Jim", e estripulias pelos corredores do Louvre, como no filme de Godard, "Bande à Part".

Em Garrel e Duris, o diretor encontra dois atores à altura de desafio de retratar personagens complexos. São eles o contraponto humano à experiência visual de "Em Paris". Dois personagens que fascinam e assustam ao mesmo tempo, num filme no qual o tom de absurdo, como pular de uma ponte por causa de uma decepção amorosa, é o que mais seduz.

(Dans Paris - 2006)

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